segunda-feira, 29 de outubro de 2012

eu sei...


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A vida possui uma sutileza que me comove. Mesmo diante de percalços, há um significado que nos faz retirar aprendizado em cada situação. Quando as coisas não saem como planejamos costumamos ficar furiosos. Eu, por exemplo, esbravejo maldizeres a Deus e o mundo. Entretanto, quando vem a escuridão silenciosa da noite e as ideias tilintam na cachola, a claridade nos toma e compreendemos melhor nossos desafios. Paciência, Fernandinha... Acho que é isso que o vento que freneticamente sacode o vidro da janela te pede.

terça-feira, 23 de outubro de 2012

sono



Eu gosto de escrever com pouca luz. Desde pequena gostava da penumbra. Lembro-me das quedas de energia em Coité... A luz amarelada da vela me fazia acreditar que era um bom momento pra ler, mesmo com a minha mãe dizendo que eu ficaria cega. Era engraçado que eu tinha medo do escuro, mas a penumbra me parecia estranhamente mágica. Envolvia-me de uma forma indecifrável.
Hoje, deitada de bruços com uma caneta sem-graça na mão, contento-me com a luz fraca do abajur. Algumas manias nos acompanham por toda vida. Chato.
Lembrei-me de uma fotografia. Eu, vestido rosa, deitada sobre um caderno desproporcional, escrevendo poesias toscas. Eu queria ser escritora... Cresci com essa ideia na cabeça e decidi fazer jornalismo para ser redatora. Fiz direito.
A vida costuma nos surpreender de diversas formas. Por mais que os dias sejam iguais, que a rotina sufoque, há sempre alguma coisa que reluz, que faz aquele dia ser singular. Hoje mesmo eu acordei com uma vontade grande de tomar sorvete. Fui pra faculdade, resolvi umas questões, vi meu namorado, voltei pra casa e decidi que iria tomar sorvete. Passei no banco, saquei dinheiro e fui numa vendinha. Não achei nem um picolé. Voltei pra casa furiosa. Fim de tarde, saio novamente pra ir pra faculdade, passo na farmácia pra comprar um remédio e o que encontro? Sorvete!  Comprei. fui feliz e serelepe pro ponto de ônibus com minha caixinha de eski-bom e percebi que seria desastroso pegar  ônibus cheio lotado tomando sorvete. Foi ai que aconteceu a preciosidade do meu dia: sentei na mureta da praia para tomar sorvete e ver o sol se pôr.
Eu não tinha me dado conta da beleza desse momento até agora.  Deitei na cama meio chateada por ter implicado com algumas besteiras e me enrolei achando que meu dia não tinha sido tão legal.  Foi ai que lembrei esses poucos minutos que fiquei sentada no muro da praia.
E relembrando esse momento, veio em minha mente uma questão antiga reiterada por Kundera em “A insustentável leveza do ser”: O que vale mais, a leveza ou o peso?
 Naquele momento breve, sentada olhando o céu e o mar, tomando o tão desejado sorvete, eu era ar. Leve como uma pluma, flutuei. 

domingo, 1 de abril de 2012

Pequena

São duas horas da manhã do dia primeiro de abril e ela acabou de dormir. Minha mãe disse que deve se chamar Francielly ou algum nome incrementado com “LL” e “Y”. Eu prefiro Maria. Fora deixada por seus pais em um bar e chegou aqui depois de meia noite, com roupas arranjadas pela senhora que a trouxe. A senhora chegou afirmando que não teria condições de cuidar da menina nesta noite e precisava de um lugar para deixá-la. Disse que foi à delegacia buscar alternativa e a mandaram para cá.
Meu pai é conselheiro tutelar desta cidade e está em sua noite de plantão. Tentou entrar em contato com outros conselheiros e, por conta do horário, não conseguiu localizar ninguém. Procurou saber se a senhora sabia algo a respeito daquela criança, se conhecia a família, mas não obteve sucesso.
O fato é que o Conselho Tutelar de Conceição do Coité não dispõe de um abrigo para crianças em situações como esta. Além disso, não há um veículo que possibilite a busca de parentes dos menores durante a noite. Dessa forma, os conselheiros acabam por ficar de mãos atadas.
A ironia é que há poucas horas, eu estava mergulhada em um livro de direito administrativo, encantada com os princípios que habitam nosso sistema. Li sobre o princípio da eficiência e entendi que o administrador deve buscar resultados positivos para o serviço público, tentando alcançar o satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros. Sensatas palavras... O direito nos livros é muito bonito.
Nessa hora, por dentro de mim, uma voz ríspida ecoa: “cadê você, administração pública? Não é função sua amparar os desamparados?” – Do silêncio sobressai a voz de Dona Creuza cantarolando uma velha canção de ninar.

quarta-feira, 8 de fevereiro de 2012

Divagar...



A chuva cai lá fora
e eu riu aqui dentro
e riem as paredes...

domingo, 8 de janeiro de 2012

e eu não sei.


o calor de janeiro me inquieta na cadeira. inquieta meus pensamentos nesta sala vazia. e a lua bate na janela. assim calma. assim branda. talvez ela queira me dizer como tenho sorte. talvez queira me sorrir. e meu corpo está sentado. e mudo. mas aqui não estou. já não sei para onde fui. e não tenho mais lugar. esse corpo lento não me cabe. a felicidade transborda minha pele. as lembranças me afagam. nevego por mares desconhecidos. já não tenho mais medo. e não tenho mais pressa.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

velas



"O mar é só mar, desprovido de apegos, matando-se e recuperando-se..." 
(Cecília Meireles)

Parece pequeno este quarto para os pensamentos que me tomam. Parece pequeno o espaço que temos. E o tempo voa. E a vida vai. E eu não sei. Quem ditou a ordem do mundo nessa marcha tediosa para frente, nesse passo descompensado? E o relógio pirraça. E pirraçam os carros. E eu prefiro ser mar...