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Estava seco. As árvores, o chão,
a minha boca. Estava seco de não saber quando novamente veria água e meu joelho
doía. Um gatilho disparou essas lembranças em mim de modo que minha garganta
arranhou como se eu ainda estivesse em cima daquele morro. Andamos um dia inteiro,
havia anoitecido e não sabíamos que caminho tomar. Faltava trilha. Eu sentia
medo e brigava com meus pensamentos – Fernanda, sua burra, o que você veio
fazer aqui? – ansiava por água e luz. O medo me cegava. Foram só alguns minutos
até a descida ser encontrada. Chegamos
ao leito do rio e encontramos amigos desconhecidos que vieram ao nosso
encontro. Ofereceram-nos água, um remédio para o meu joelho e companhia. Foram as
melhores.
Hoje sobre a luz sombreada do
abajur enxergo a preciosidade daquele dia. Lembro como a água foi deliciosa e a
comida um banquete e percebo que na vida temos que aprender a simplificar. Desafios
sempre chegam para todos, em medidas diferentes, mas chegam. Eles chegam para
nos engrandecer. A angústia do morro me fez outra pessoa e fui também outra
quando chorei por um tropeço... Assim é a vida, cheia de transformações
diárias. Repito: os desafios chegam para nos engrandecer. Somente nós podemos
decidir se aceitamos os desafios ou se deixamos que o medo de vivê-los nos
encolha.